10 de novembro de 2013

35 - Basta apenas produzir, ou não?

(Ivan Siqueira)
 Demanda é demanda, não é desejo de demandar! O que configura a demanda de qualquer coisa, de produtos, de moeda, de investimentos, é efetivamente aquela coisa ter sido comprada, se havia apenas uma vontade de comprar, mas se a compra não se efetivou, não houve demanda! Assim, esse termo demanda efetiva é redundante, toda demanda é efetiva!

E a oferta? Você já ouviu alguém falar em oferta efetiva? Eu nunca ouvi, nem li sobre isso! Estranho, né? Por que somente a demanda é efetiva? Quando se dá a oferta? Oferta também não é apenas desejo de ofertar, mas em que momento a oferta se torna oferta efetiva? Aparentemente é quando o produto ou serviço ficou pronto e foi colocado a venda no mercado!  Então, suponha que uma latinha de cerveja foi produzida e foi oferecida no mercado pelo valor de venda de R$4,00, e que dentro desses R$4,00 aproximadamente R$2,60 são salários pagos aos empregados da fábrica, e R$1,40 seja de lucros dos proprietários da fábrica. Estamos supondo que a renda seja formada apenas de salários e lucros, e desconsiderando juros e aluguéis que são, também, parte da renda, mas, para efeito de simplificação, nossa renda é formada apenas de salários mais lucros. Assim, no nosso exemplo, salários são 65% da renda e lucros são 35%. Não é muito diferente da realidade.

Na minha época de faculdade,  nos intervalos de aulas, sentávamos em uma calçada interna do pátio e ficávamos economeditando sobre as aulas, que tempo bom! Alguns de meus colegas  gostavam de dizer que os operários, coitados, não tinham poder de comprar nem aquilo mesmo que eles produziam, que não podiam comprar nem o edifício que eles próprios construíam com o seu suor! É uma grande observação esta,  é uma grande verdade, a latinha custa R$4,00 e o trabalhador ganhou apenas R$2,60, não pode comprar a cerveja que ele mesmo trabalhou e fabricou, é lógico, sempre haverão lucros em cima dos custos, e o trabalhador não tem a parte dos lucros! Salários são a remuneração do trabalho, lucros são a remuneração de capitalistas pelo uso de seus capitais! A soma de salários e lucros é a renda, ou a produção, ou a despesa, são iguais. Mas, de forma mais completa, a renda é o somatório de salários, juros, aluguéis e lucros. Em nosso exemplo estamos fazendo uma simplificação.  

Ali naquela calçada, nos momentos de lazer, no intervalo das aulas, fazíamos de tudo, paqueras, piadas, trocávamos opiniões sobre a vida nacional, e havia um dos estudantes de economia bastante diferenciado, ele questionava permanentemente o capitalismo, e de uma forma sempre muito inteligente, falava baixo, de modo concentrado, e tinha argumentos que, via-se, eram resultado de estudos que ele fazia, mas ele tinha uma outra particularidade, sempre aparecia com um violão(de onde saía aquele violão?), sentava-se ali naquela calçada, e com o seu violão tocava e cantava belíssimas canções que ele compunha, era um desconhecido, só sabíamos que ele era filho do rei do baião, Luiz Gonzaga, ele era o Gonzaguinha. Sua música é muito parecida com o que ele realmente era!

Mas, voltando para o assunto desse post, os que acham que os trabalhadores não têm a renda suficiente para comprar o que eles próprios produziram, esquecem de ver, que o capitalista, então, tem menos ainda,  a latinha está sendo ofertada a R$4,00, mas o capitalista só ganhou R$1,40, também não compra a latinha de cerveja que o empreendimento dele produziu, porque o capitalista não é o dono dos salários, apenas dos lucros, pra comprar a latinha ele teria que pegar emprestado os salários dos trabalhadores! Mas, trabalhadores e capitalistas, uni-vos, porque juntos vocês têm a renda necessária para demandar o que ofertaram!

Aí, entra em cena, a lei de Say, “a oferta cria sua própria procura”. Dizem que Say jamais disse isso textualmente, mas com toda certeza pensava isso, e escreveu sobre isso!  Mas e a cerveja? Ofertaram por R$4,00 a latinha, e têm poder de demanda de exatamente R$4,00, ou seja, o ato de produzir gerou uma renda suficiente(R$2,60 + R$1,40) para comprar a oferta(produção). Não pode haver crise econômica, tudo o que é produzido gera a renda pra comprar a produção! Senão, vejamos o que Say disse:  “tão logo um produto seja criado, nesse mesmo instante gera um mercado para outros produtos em toda a grandeza de seu próprio valor”. Você viu, citei o texto dele, basta produzir, a produção(ou oferta efetiva), gera uma demanda efetiva de mesmo valor, mesmo que vá ser usada em outras partes do mercado, em outros produtos . Aí, meu caro amigo internauta, a ideologia tomou conta da vida! Era tudo o que os adeptos do capitalismo precisavam para defender o capitalismo, a frase veio para a ponta da língua da boca do mundo: o capitalismo não gera crises, porque a oferta cria sua própria procura!  Se o capitalismo é bom ou ruim, estamos todos interessados em saber, quem souber avise ao outro, mas antes temos uma tarefa: como questionar a lei de Say?

 David Ricardo e Adam Smith acolheram a lei de Say, mas Malthus e depois Keynes a recusaram. A oferta não cria sua própria procura, contestando os economistas clássicos. Enquanto a economia clássica é uma economia da oferta efetiva, a economia keynesiana é a economia da demanda efetiva. Não adianta apenas produzir, a demanda tem renda para comprar a produção, mas comprou?  Vou seguir nessa história, mas agora vou ouvir a canção “O Trem”, do meu colega Gonzaginha, ela não fala de Say, nem ao menos de economia, mas fala de um mundo melhor!  Volto ao assunto a qualquer momento. Quem teve peito de contestar a lei de Say? Ricardo e Malthus eram amigos e trocavam cartas, Ricardo defendia a lei de Say, mas Malthus mostrou que enxergava longe!

Ivan Siqueira

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